Ouvindo o aboio de um peão aqui na roça ao conduzir meia dúzia de ‘gado pingado’, fui pesquisar na net sobre a origem do aboio e me deparei com um artigo belíssimo de Lúcia Gaspar, Bibliotecária da Fundação Joaquim Nabuco.
Sem mudar nem vírgula, e
principalmente ela, segue seu texto na íntegra e entre aspas. E para fechar com
chave de ouro, segue o vídeo “Caboclos aboiando no Nordeste e Homens de Couro” (um
verdadeiro achado num garimpo) do Programa Caminhos da Roça, com reportagem de Dirceu Martins e imagens de Chico Escolano. É prosa em poesia cantada,
pessoaR. Imperdível!
Por Lúcia
Gaspar
É um canto ou toada um tanto dolente, uma melodia lenta, bem adaptada ao
andar vagaroso dos animais, finalizado sempre por uma frase de incitamento à
boiada: ei boi! Boi surubim! Ei lá, boizinho!
Esteja atrás (no coice) ou adiante da boiada (na guia) o vaqueiro sugestiona
o gado que segue tranquilo, ouvindo o canto.
No sertão do Brasil é sempre um canto individual, entoado livremente,
sem letras, frases ou versos a não ser o incitamento final que é falado e não
cantado. Os que se destacam na sua execução são apontados como bons no aboio.
Existe também o aboio cantado ou aboio em versos que são poemas de temas
agropastoris, de origem moura e que chegou ao Brasil, possivelmente, através
dos escravos mouros da ilha da Madeira, em Portugal, país onde existe esse tipo
de aboio.
Segundo Luís da Câmara Cascudo, o vocábulo aboio é de origem brasileira,
sendo levado para Portugal, uma vez que lá aboio significava pôr uma boia em
alguma coisa.
O aboio não é divertimento é uma coisa séria, muito antiga e respeitada
pelo homem do sertão.
Pode aboiar-se no mato, para orientar os companheiros dispersos durante
as pegas de gado, sentado na porteira do curral olhando o gado entrar e guiando
a boiada nas estradas. Serve para o gado solto no campo, assim como para o gado
curraleiro e até para as vacas de leite, mas em menor escala, porque nesse caso
não é executado por um vaqueiro que se preze e tenha vergonha nas ventas.
O escritor José de Alencar, no seu livro O sertanejo, diz do ritual do
aboio: Não se distinguem palavras na canção do boiadeiro; nem ele as articula,
pois fala do seu gado, com essa linguagem do coração que enternece os animais e
os cativa.”
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